A CONVIVÊNCIA ENTRE PROATIVIDADE E REATIVIDADE NO MODELO DE NEGÓCIO

Postado em 01/11/2013 | Autor: proatividade

Em nosso livro Empresas Proativas, descrevemos de que forma as empresas podem equilibrar as estratégias proativas e reativas. Trata-se de uma fina habilidade, por dizer respeito precisamente ao balanceamento entre duas posturas estratégicas com orientações bem distintas. A literatura há muito trata das chamadas empresas ambidestras, justamente aquelas que conseguem ser bem sucedidas nesse gerenciamento. Não é uma tarefa fácil, pois um modelo inovador e proativo acaba sempre se colocando como desafiante ou até mesmo concorrente do modelo tradicional estabelecido.

Sabemos que gerentes proativos devem aprender a atender demandas conflituosas ao mesmo tempo, como por exemplo, eficiência operacional e experimentação, atendimento de prazos e metas e inovação industrial. Além disso, estratégias proativas quase sempre requerem uma mudança profunda na cultura da empresa, na forma como essa lida com riscos, erros, inovação, com a forma como ela mira o futuro, com a própria segmentação de mercado vigente. E nem sempre a convivência entre demandas tão díspares se mostra viável. Falhe em lidar com isso e a proatividade de mercado naufragará antes mesmo de deixar o porto. Fica, então, a pergunta:

Como implementar um modelo de negócio proativo que não colida com o modelo de negócio existente?

A resposta a essa pergunta passa por duas questões complementares:

(A) O quanto de similaridade existe entre os dois modelos?

(B) O quanto de conflito poderá existir entre os dois modelos?

Markides, da London Business School, coloca as respostas a essa duas questões em quatro estratégias possíveis e diferentes:[1]

(1) A primeira delas diz respeito aos casos de baixa similaridade e alto conflito. A saída aqui é a separação dos modelos. Nessa realidade geralmente a nova unidade de negócio (inovadora e proativa), passa a ser vista com reservas pela unidade tradicional. Os altos custos e o risco associado às estratégias do modelo proativo quase sempre não são bem assimilados pelos gestores. Isso poderá sufocar o novo negócio, por corte de recursos ou até mesmo boicotes. Ao mesmo tempo, a baixa similaridade entre os modelos (ou seja, a atuação em mercados bastante distintos) deixa pouco espaço para sinergias na cadeia de valor. A saída, então, é desmembrar totalmente o modelo proativo da empresa-mãe.

Foi o que fez a Nestlé em relação à subsidiária Nespresso (veja post anterior). Embora a atuação dos dois modelos se dê no mesmo mercado (café), trata-se aqui de segmentos absolutamente diferentes (Nescafé/Café Instantâneo/Mercado de Massa – Nespresso/Café Espresso Gourmet/Mercado High-End). Baixo potencial de sinergias entre os modelos (Fornecimento, Produção, Logística, Marketing) e conflitos inevitáveis de canibalização entre as duas marcas (Nescafé e Nespresso) foram resolvidos com a separação das UENs. O modelo proativo de Nespresso garantirá a Nestlé, neste ano, 5 bilhões de dólares anuais de faturamento com margens estimadas em 30%. Sem comprometer o negócio estabelecido no mercado mass-market de café solúvel.

(2) No extremo oposto temos o caso de alta similaridade e baixo conflito. Aqui, obviamente, a separação cede espaço para a estratégia de integração. Foi o caminho adotado pela também suíça SMH, quando do lançamento da marca Swatch. Protagonista de uma verdadeira revolução na indústria – e responsável pela guinada de sucesso da empresa – o modelo Swatch (relógios fashion de baixo custo para os segmentos mid e low-end) foi operado aproveitando-se das sinergias com o negócio tradicional (relógios de luxo para o segmento high-end). Seguindo essa estratégia até hoje, o modelo de negócios Swatch consagra a integração produtiva, de compras e de pesquisa e desenvolvimento da SMH; ao mesmo tempo, tem autonomia nas ações específicas de design e marketing, especialmente comunicação. A atuação em segmentos diferentes inibe a canibalização e sombreamento de mercados.

Um exemplo nacional nesse sentido é a conexão de modelos de negócio distintos observada na indústria moveleira gaúcha. Grupos como Unicasa (Dellano, Favorita, Telasul, New) e Todeschini (Todeschini, Italínea, Criare) aproveitam a sinergia de supply-chain e manufatura para marcas atuantes em diferentes segmentos, o que otimiza os ganhos e resguarda a atuação de conflitos via canibalização. Já nos canais e na comunicação as estratégias entre os diferentes modelos diferem radicalmente, sendo operadas de forma autônoma.

Mediando essas duas estratégias, temos dois tipos variantes:

(3) O primeiro ocorre quando há baixo conflito, mas também baixa similaridade. É o caso de negócios que servem a mercados absolutamente diferentes, não conflitando entre si. Mas se por um lado não há o conflito, em outro se perde justamente pela impossibilidade de sinergias entre os modelos. Nesse caso, fala-se em uma estratégia de separação gradual (phased separation). A ideia aqui é o novo modelo valer-se dos recursos e da experiência do modelo tradicional, para somente após isso desconectar-se. Cita-se o caso da rede de supermercados britânica Tesco, a qual adotou justamente esse procedimento de separação gradual em relação ao braço de vendas online Tesco.com.

(4) Por último, o caso de alta similaridade e alto conflito. Aqui, as sinergias entre os modelos é o lado positivo, mas há o problema dos conflitos entre culturas absolutamente distintas, ou mesmo pela possibilidade de canibalização. A saída, em face disso, é adotar o que se chama por estratégia de integração gradual (phased integration) Em outras palavras: os dois modelos começam separados, mas aos poucos vão se integrando sob um único guarda-chuva de negócios. Essa foi a estratégia adotada pela corretora Charles Schwab em relação ao modelo de negócios via internet implementado.

Finalizando, uma questão de extrema relevância. Mais importante do que a escolha por uma das duas estratégias (separação ou integração) ou suas variações graduais, é o gerenciamento da estratégia escolhida. Nesse sentido, é muito importante que uma estratégia de separação não afaste o aproveitamento das sinergias entre os modelos, enquanto naquela de integração a essência é a administração dos conflitos, inevitáveis e dela recorrentes.

Estudos têm relatado casos de sucesso e de insucesso tanto em casos de separação, como nos de integração. Isso deixa claro que o fator-chave para a empresa ser bem sucedida na escolha é menos uma questão do tipo de estratégia, do que como ela irá operar a estratégia escolhida.

Como visto, lidar com as sinergias e conflitos no modelo de negócio é mais uma capacidade essencial das Empresas Proativas.

 


[1] Game-Changing Strategies, Jossey-Bass, 2008. 



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