O desconto do futuro

Postado em 04/04/2012 | Autor: Proatividade Mercado

“O presente já me dá bastante dor de cabeça…”
Ouvido de um executivo, comentando sobre o longo prazo.

Alguns anos atrás – conta o neurocientista David Eagleman1 – os famosos psicólogos Daniel Kahneman e Amos Tverski (pioneiros nos estudos da decisão sob incerteza) sugeriram o seguinte mote: o que você escolheria? 100 dólares agora ou 110 daqui a uma semana? Um bom número de respondentes escolheu pelos 100 dólares imediatos. Mais tarde, aplicaram a mesma questão, mas de forma um pouco alterada: e se eu lhe oferecesse 100 dólares daqui a 52 semanas ou 110 daqui a 53? Nesse caso, as pessoas tendiam a mudar suas preferências, optando em esperar uma semana a mais. Se as duas proposições são absolutamente idênticas (esperar mais uma semana garante um ganho de 10 dólares), por que causam comportamentos diferentes?

O motivo tem um nome – segue explicando Eagleman –: o chamado “desconto do futuro”. Se puder ganhar hoje não quero esperar uma semana a mais; se essa espera estiver no futuro, bem, aí parece que tanto faz. Em palavras simples, descontar o futuro significa valorizar as recompensas do presente em detrimento de recompensas posteriores. É trocar o futuro pelo presente. No dito popular: “mais vale um pássaro na mão do que dois voando”. O agora, certo e real, fascina e faz esquecer o amanhã. Isso porque o cérebro humano parece privilegiar os “circuitos de recompensa imediata”, voltados à satisfação dos desejos no aqui e agora. É assim na vida e nas empresas. Estratégias de longo prazo sucumbem diante dos ganhos de curto prazo. “Mais vale um presente na mão do que dois futuros voando…”

Utilizamos o termo “ditadura do curto prazo” para representar a premência das empresas pelo retorno imediato. Estratégias de retorno mais incerto e vagaroso têm pouco espaço nessa realidade. O chamado “capital impaciente” – acionistas e investidores nada dispostos a esperar para ver – coloca as decisões sobre a urgência do ganho líquido e certo.  Verdade do curto prazo: redução de custos, diminuição dos investimentos em inovação, nenhum tempo para pensar o futuro, incentivos quantitativos trimestrais, cultura imediatista. Como ser proativo nesse cenário?

Já falamos aqui (veja post) sobre a “Balança do Gerenciamento”, um mecanismo que idealizamos para auxiliar os estrategistas a equilibrarem suas decisões de curto e de longo prazo. Mas outra capacidade ligada a essa questão diz respeito ao que chamamos de Cultura do Longo Prazo.” Uma CLP engaja todos na empresa em uma visão mais equilibrada entre as demandas do presente e do futuro. Essa cultura se apóia em duas ferramentas distintas e complementares: um Sistema de Indicadores de Longo Prazo e uma Política de Incentivos de Longo Prazo.Vamos ver como isso funciona:

Sistema de Indicadores de Longo Prazo.Tenha somente indicadores de curto prazo e sua empresa dificilmente pensará o amanhã. Estudos observam que a ênfase nas tradicionais métricas financeiras de desempenho imediato incentiva os gestores justamente a adotarem uma orientação de curto prazo. Em sentido inverso, a inserção de medidas não-financeiras – como, por exemplo, aquelas voltadas aos clientes e à inovação – têm sido vistas como uma maneira de incrementar uma postura gerencial também voltada ao longo prazo. Em palavras simples: a natureza das métricas de desempenho influencia de forma drástica o comportamento gerencial. Gestores agem também movidos pelos estímulos externos a que estão submetidos, ao mesmo tempo em que resguardam seus interesses pessoais e a própria sobrevivência profissional. Nenhum gerente apostará no longo prazo quando é auditado pelo curto prazo.

Política de Incentivos de Longo Prazo. Quem vai arriscar uma estratégia com mais proatividade se poderá perder o emprego se ela não der certo? Por que arriscar o resultado do trimestre em prol de tentativas estratégicas que podem diminuir o desempenho presente (e o bônus a ser auferido)? Assim, o sistema de compensação da empresa deverá fomentar as estratégias de retorno mais lento, e não afugentá-las. Estratégias proativas muitas vezes contabilizam seus resultados somente após um ou dois anos, ou mesmo em períodos de tempo mais longos, portanto, são incompatíveis com um sistema de incentivos imediatista. Nesse caso, é mais indicado atrelar os ganhos a incentivos mais aderentes a retornos de longo prazo, como por exemplo, proveitos em forma de bônus ou ações.

Warren Buffet | Fonte: Google Imagens

Essas ferramentas, acreditamos, podem dar início a uma mudança cultural na empresa, abrindo avenidas de pensamento mais flexíveis e menos deterministas. Enquanto escrevemos essas linhas, no entanto, estrategistas seguem descontando a duplicata do futuro em prazos cada vez mais exíguos, encurralados pala ditadura do curto prazo. Um cenário nada amigável para quem quer pensar na frente e antecipar momentos-zero. Como bem disse o mega-investidor Warren Buffet em dada ocasião, “se decisões ruins forem tomadas com o intuito de atender-se às metas de curto prazo, nenhum brilhantismo posterior irá reparar o prejuízo que terá sido infligido.” Pense nisso.


[1] David Eagleman, INCOGNITO: The Secret Lives of the Brain. Londres: Canongate Books, 2011.



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