Momentos-Zero Cadentes e Pulsantes na Indústria do Livro

Postado em 05/04/2012 | Autor: Proatividade Mercado

E a Enciclopédia Britânica versão impressa acabou. Depois de quase 250 anos e 7 milhões de exemplares vendidos, estará disponível agora somente em formato digital. Em tempos em que crianças (e seus pais) consultam o Google e a Wikipedia, realmente ficou difícil para a Britânica competir. A notícia traz à tona um assunto que vem sendo alvo de viva discussão já há algum tempo: o livro (e revistas e jornais) impresso vai desaparecer? O paradigma “tinta e papel” estará vivendo o seu ocaso? O mercado editorial será apenas digital? Ou, para utilizar um termo que costumamos empregar: será o livro tradicional um “momento-zero cadente”?

Para entender melhor essa história voltemos no tempo duas décadas: O livro em papel constituía a única oferta padrão concebível; editores tinham nas livrarias o canal único de distribuição; clientes apresentavam preferências e necessidades não muito diferentes daquelas de seus avós. De volta para o futuro: O e-book cada vez mais rivaliza com o livro impresso pelas vendas no mercado; a distribuição de livros online – grande momento-zero protagonizado pela Amazon.com em 1995 – representou uma mudança radical na dinâmica de competição da indústria; a preferência pela leitura em livros impressos já cede parte de seu espaço para a leitura digital.

 

Perguntamos hoje o que vem pela frente. Ou melhor, que momentos-zero pulsantes (lembre, aqueles que já piscam na tela do RADAR) nas três dimensões da Proatividade de Mercado (Oferta, Indústria e Cliente) podem se revelar promissores na indústria do livro? Alguns sinais parecem já pulsar com relativa intensidade em alguns dos níveis do modelo DNA (Dimensões, Níveis e Ações da Proatividade de Mercado). Alguns deles:

No nível da Oferta Padrão, pense nos Blogs. Idealizados para simplificar a criação de espaços na web, os blogs alargaram seu espectro de utilização de tal forma que hoje representam uma nova alternativa para as pessoas difundirem suas idéias e trabalhos. Um escritor pode optar em publicar seu mais novo livro em capítulos periódicos postados em seu blog, ou confiar a publicação a um cyber-editor. Essa integralização da função editorial pelos autores já é considerada hoje uma realidade potencial na indústria do livro.Até que ponto a chamada “blogosfera” pode estar representando um novo e proeminente canal de publicação? Existirá o livroblog?

No nível da Oferta Complementar, veja o caso dos acessórios para e-books. Ao contrário do que se pensa, o livro eletrônico (se cresce em vendas) não abalou a venda de livros impressos; pelo contrário, nunca se produziram tantos títulos na maneira tradicional. A maioria dos leitores segue reticente aos novos formatos de leitura digital e um dos motivos disso é que outros sentidos, e não só a visão, parecem ser muito importantes no ato da leitura. Que sinais essa realidade que chamaríamos de híbrida (utilização do livro eletrônico e saudosismo pelo livro papel) pode estar revelando? Por exemplo, uma pesquisa com estudantes franceses revelou que para 45% deles o cheiro do livro é um atributo fundamental nesse produto. Pensando nisso, a CafeScribe, editora de livros online francesa, oferece aos seus leitores um adesivo que quando colado ao leitor de textos exala o inconfundível cheiro de livro antigo.Uma ação proativa de geração no nível da oferta complementar de e-books, originada da análise de um momento de transição do mercado. Que outros sinais podem estar pulsando em relação a esse fenômeno neste exato momento? Existirá o ebook papel?

No nível da Distribuição da Indústria, considere os novos formatos de PDVs que podem ir muito além da conhecida livraria. Alguns momentos-zero pulsantes já foram transformados em realidade nesse contexto: é o caso da 24×7 Cultural, empresa brasileira criada pelo médico Fabio Lopes Netto, que em 2003 inovou ao criar o acesso self-service a livros de baixo preço em pontos de grande movimento. Leitores podem acessar centenas de obras numa encadernação despojada e econômica, enquanto aproveitam o tempo esperando pelo metrô. Entre doze e quinze mil livros são vendidos mensalmente hoje pela empresa, 24 horas por dia, 7 dias por semana, em máquinas instaladas em estações de metrô de São Paulo e no Rio de Janeiro. Se refrigerantes e salgadinhos podem ser vendidos em máquinas, por que não livros? O que mais pode ser inventado para distribuir livros físicos? O livro self-service irá ser dominante no mercado?

No nível das Preferências dos Clientes, avalie a criação de novos segmentos de mercado. O exemplo vem da Abebooks.com, livraria virtual que disponibiliza atualmente mais de 140 milhões de livros, agregando milhares de pequenas livrarias dos quatro cantos do mundo. Uma significativa parcela dessa oferta é composta por livros raros e fora de catálogo, atendendo a uma demanda suscetível e disposta a pagar um valor expressivo por primeiras edições, obras autografadas, de tiragem limitada, ou encadernadas de forma especial.  Uma nova preferência de um novo segmento de mercado: pessoas aficionadas por livros raros, mas que se servem sem cerimônias das novas tecnologias de distribuição do mercado.               

Uma questão que fica após analisarmos esses poucos exemplos: a indústria do livro já não é mais a mesma, e vem muita coisa nova por aí. O que isso pode ensinar para a sua empresa, mesmo que distante desse mercado?

Ensinamento 1:

A dinâmica de momentos-zero cadentes e pulsantes nunca pára, e que quem não conseguir antecipá-la poderá ser submergido pela onda da mudança.

Ensinamento 2:

Momentos-zero muitas vezes passam um bom tempo hibernando antes que alguma empresa tire proveito deles ou a própria realidade de mercado esteja pronta para despertá-los. Você sabia que o antepassado direto do e-book surgiu na década de quarenta?

Ensinamento 3:

O bolso do consumidor ainda comanda muita coisa:  A edição impressa da Britânica, com 32 volumes, disponível a cada dois anos, era vendida por US$ 1.400. Uma assinatura on-line custa cerca de US$ 70 por ano, e a empresa lançou recentemente aplicativos que variam de US$ 1,99 a US$ 4,99 por mês.  A maioria dos livros oferecidos nas máquinas da 24×7 cultural custa até R$ 5. Existem também máquinas temáticas, como a que oferece livros de leitura obrigatória para vestibulares a partir de R$ 3, com foco na democratização do acesso às universidades. O “P”de preço parece ser um bom direcionador de momentos-zero pulsantes.

Ensinamento 4:

A cegueira das empresas em relação ao novo é uma constante. Uma pesquisa feita em 2010 pelo Book Industry Study Group junto a quase 200 CEOs, diretores e executivos ligados à indústria do livro, evidenciou a dificuldade dos estrategistas em enxergar os momentos-zero pulsantes e acreditar em sua iminência1:

  • 41% dos entrevistados revelaram não antecipar mudanças significativas na indústria;
  • 74% disseram não estar considerando em suas estratégias as mudanças tidas como sem volta (points of no return) que já se delineiam;
  • 61% consideraram o Twitter um modismo passageiro;
  • 38% foram céticos a mudanças como a do preço livre (free as a price point) e o crescente impacto de conteúdos gerados pelos leitores (como ocorre, por exemplo, na avaliação de publicações em sites como a Amazon.com.).

A dificuldade das empresas em imaginar como será a indústria do livro num futuro próximo foi resumida na fala de um entrevistado: “o assustador nisso tudo é que nós não sabemos o que não sabemos”.

Na indústria do livro, parece que uma boa parte dos estrategistas precisa ajustar o radar dos momentos-zero pulsantes e aprender mais com as latências do mercado.

E na sua empresa?


[1] Mike Shatzkin, “Selected Results from 2010 BISG Making Information Pay Survey” 2010 Book Industry Study Group, www.bisg.org/contentweb/wp-content/uploads/mip2010.pdf. (p. 8).



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